Para não esquecer
[trechos do meu diário de 05 de agosto de 2024]
Me mudei para a Argentina fazem quase dois meses. Estimo 21 alfajores, 30 empanadas, frio de 0°, incontáveis frases com “parrilla, cubiertos y vinos”, uma viagem de trem, 15 cortados, um número enorme de fotografias analógicas, no celular e na Instax. Algumas meticulosamente pensadas, outras rapidamente sacadas. Tenho vontade de capturar mais do que a imagem, se pudesse, guardaria o cheiro dos quiosques com incenso e o som da 9 de Julho na final da Copa América.
Notei que o hábito de ler jornal físico persiste aqui. Assisti “El Beso de la Mujer Araña” no teatro, comi no restaurante peruano indicado pelo Ro — que por sinal restaurou minha alegria de viver. Na exposição com obras da Frida, fiquei pensando sobre uma carta que ela enviou para a amiga. Engraçado ver a letra das pessoas. Ainda mais contando trivialidades, como ela descrevia um quarto de hotel. Encontrei a Allyne depois de dois anos e foi como se o tempo não tivesse passado.
Moro na Recoleta, o bairro que já foi mais legal, que tem um charme decadente, dizem. Não me acostumei com a casa de chás aberta até 2h da manhã, nem em experimentar o vinho antes de ser oficialmente servido, função que deixo com Lucas.
A relação com a arte é outra aqui. A relação com a memória também. Os assassinatos da ditadura argentina ainda são uma linha intransponível, até para o negacionismo da extrema-direita. “Nunca más” ecoa em todos os lugares. Outras coisas que continuam sendo unanimidade, independentemente da visão política, são a seleção e as Malvinas.
Hoje faço 32 anos. Feliz que um pedacinho desse tempo foi aqui. Só, mas cheia de vida.